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Terça-feira, 5 jun 2007 - 10h15

Nave terrestre dispara contra planeta distante

Imagine a seguinte cena, que parece extraída de um filme de ficção científica: Uma espaçonave manobra em pleno vácuo espacial e se posiciona a frente de um planeta do tamanho da Terra. Após mirar sobre seu alvo, dispara feixes de raios laser, que atravessam as densas nuvens do planeta, na tentativa de atingir a superfície escondida. Enquanto isso, a milhões de quilômetros de distância, os chefes da missão e diversos cientistas aguardam ansiosos os resultados dos "tiros de luz".

Como dissemos, parece até ficção científica, mas é o que realmente estará acontecendo no dia de hoje, às 20h08 pelo Horário de Brasília.

O nome da espaçonave é Messenger e o planeta é Vênus. Exatamente no dia de hoje, a Messenger estará a apenas 338 quilômetros acima da superfície de Vênus, disparando dezenas de fachos de luz, gerados a partir de um laser de 20 watts de potência.

Na realidade, a sonda Messenger não está em missão à Vênus. Seu destino final é Mercúrio, mas para ganhar um impulso extra praticamente mergulhará em direção ao planeta, com o objetivo de utilizar sua força gravitacional para dar uma "estilingada" em direção ao seu objetivo, que deverá ser atingido em janeiro de 2008.

Durante esse mergulho, os pesquisadores esperam aprender algumas coisas a mais sobre esse planeta vizinho da Terra, mas que não se parece nem um pouco com ela. Vênus é um mundo recoberto por nuvens de ácido sulfúrico, uma sufocante atmosfera de dióxido de carbono e uma superfície tão quente que é capaz de fundir até o chumbo.

"Quando nos aproximarmos de Vênus, estaremos fazendo uma espécie de ensaio geral para as operações em Mercúrio", disse Sean Solomon, cientista-chefe da missão, ligado à Instituição Carnegie, de Washington. "Todos os instrumentos científicos estarão ligados e operando continuamente. É um ensaio com todos os atores presentes", completou.

Os disparos de laser são um dos principais experimentos, e tentarão medir com precisão a camada atmosférica de Vênus. "O experimento poderá ser um completo malogro ou produzir resultados muito interessantes", diz Ralph McNutt, do Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins, e um dos cientistas do projeto Messenger. "Nunca disparamos um único raio laser em direção a Vênus. Essa experiência pode nos dar informações únicas e muito valiosas sobre a atmosfera do planeta. Estamos ansiosos pelos resultados”.


Laser e sorte
O experimento em questão se chama MLA, sigla para Altímetro Laser para Mercúrio e foi projetado especialmente para mapear a topografia do planeta, mas também possui propriedades que o tornam interessante para estudar Vênus. A atmosfera venusiana e suas nuvens são quase transparentes a alguns comprimentos de ondas na região do infravermelho, entre eles o comprimento de onda de 1064 nanômetros, conhecido como infravermelho extremo e utilizado no laser MLA. Isso significa que seu feixe poderá penetrar fácil e profundamente na atmosfera de Vênus. "Será um feixe muito longo, de quase 400 quilômetros, mas acredito que podemos captar os reflexos da superfície", disse Solomon.

"Quando se trata de exploração planetária, você pode dar a si mesmo a chance de poder contar com a sorte", disse McNutt. "Foi o que aconteceu. Tínhamos o MLA a bordo da Messenger e pudemos apontá-lo para Vênus. Se tivermos resultados interessantes, poderemos enviar futuramente uma nova sonda a Vênus, com instrumentos semelhantes, que nos ajudarão a compreender melhor nosso vizinho".

Além do MLA, a Messenger irá inspecionar Vênus usando diversos instrumentos, entre eles uma câmera de alta resolução, um conjunto de espectrômetros capazes de observar desde o infravermelho até os raios-gama, um contador de partículas e um magnetômetro. Os dados desses instrumentos poderão dar mais luz à química da atmosfera de Vênus e como ela interage com o vento solar.


Sem proteção
Ao contrário da Terra, Vênus não tem nenhum campo magnético para proteger o planeta das tempestades solares. Rajadas de partículas carregadas, viajando a 300 quilômetros por segundo (1 milhão de quilômetros por hora), atingem Vênus constantemente com força total, removendo parte de material do topo da sua atmosfera.

De acordo com Solomon, ainda existe muito a compreender como esse bombardeio energético funciona. "Sabemos que esse processo é muito efetivo para os elementos mais leves como o hidrogênio. O que queremos é captar esse processo em ação e estudá-lo".

Vênus é o planeta que mais visitas recebeu de sondas terrestres, mas nunca com instrumentos tão sofisticados. "A história da exploração planetária nos ensina que logo depois de algum experimento podemos esperar sempre pelas surpresas. Acho que desta vez não será diferente", acredita Solomon.


Messenger e Vênus Express
A sonda Messenger foi lançada no dia 3 de agosto de 2004 a partir de um foguete do tipo Delta II e injetada na órbita solar 57 minutos depois.

A sonda deverá realizar três aproximações máximas de Mercúrio. A primeira no dia 15 de janeiro de 2008, a apenas 200 quilômetros de altura do planeta. A segunda está prevista para 6 de outubro e a terceira para 30 de setembro de 2009.

A ESA, Agência Espacial Européia, também possui uma sonda muito bem equipada, chamada Vênus Express, orbitando e estudando o planeta, mas isso não diminui o valor dessa experiência da Messenger. Ao contrário, duas espaçonaves em órbita de Vênus, mesmo que temporariamente, já é um grande negócio. Segundo Solomon, isso trás uma oportunidade sem precedentes de estudar a circulação da atmosfera e a estrutura e química das nuvens, além de permitir estudar a interação desses elementos através de duas perspectivas e plataformas distintas, uma complementando a outra.

Artes: No topo, imagen do planeta Vênus, captada em fevereiro de 1990 pela sonda norte-americana Galileu. Na seqüência, o sistema de laser e sensores usado na sonda Messenger. O canhão laser é o instrumento no centro, cercado por quatro telescópios que deverão captar a luz refletida. Acima, concepção artística da nave Messenger, orbitando Mercúrio.

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