O litoral brasileiro vai bem além do que se vê a partir das areias e morros. Para obter o reconhecimento internacional dessa extensão, uma comitiva brasileira desembarcou no último domingo (29) em Nova York, Estados Unidos. De acordo com a assessoria da Marinha, nesta terça-feira (31), na ONU - Organização das Nações Unidas, o grupo inicia a apresentação de um projeto que estabelece e amplia o limite exterior da Plataforma Continental. Conhecido como Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (Leplac), o documento determina a área marítima na qual o Brasil exercerá direitos de soberania para a exploração e aproveitamento dos recursos naturais do leito e do subsolo marinho [ veja o mapa ]
Sob a coordenação do vice-almirante Lúcio Franco de Sá Fernandes, técnicos da Marinha e Petrobrás, cientistas e representantes do Ministério das Relações Exteriores ficam até o dia 17 de setembro nos Estados Unidos à espera da aprovação do plano.
Caso isso aconteça, a ZEE - Zona Econômica Exclusiva brasileira aumentará o equivalente às áreas, somadas, dos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (cerca de 900.000 km²).
O termo “Zona Econômica Exclusiva” foi criado na Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, em 1982. Representa uma faixa de 200 milhas de largura ao longo do litoral. O Brasil ratificou o acordo fechado na Convenção em 1988. Em novembro de 1994, o documento passou a vigorar internacionalmente. Os países ganharam 10 anos para apresentar um estudo sobre a verdadeira extensão da Plataforma Continental.
Prolongamento natural da massa terrestre de um estado costeiro, a plataforma brasileira ultrapassa as 200 milhas da Zona Econômica Exclusiva, chegando a quase 350 milhas. Somadas, a plataforma e a zona caracterizam o que os oficiais da Marinha chamam de imensa Amazônia Azul, medindo quase 4,5 milhões de quilômetros quadrados.
“Esse gigantesco território marítimo, inimaginavelmente rico, acrescenta ao país uma área equivalente a mais de 50% de sua extensão territorial”, ressaltou o almirante-de-esquadra Roberto de Guimarães Carvalho, em artigo publicado pelo Ministério da Defesa em março deste ano.
De acordo com ele, os estudos sobre a plataforma começaram em junho de 1987. A fase de levantamento de dados encerrou-se em novembro de 1996, quando foram coletados cerca de 150.000 km de perfis sísmicos, batimétricos, magnetométricos e gravimétricos ao longo de toda a extensão da margem continental brasileira.
A tecnologia de pesquisa é hoje considerada referência para o mundo. Países como a Namíbia recorreram ao Brasil para realizar o próprio levantamento.
Direitos e deveres - Oceanógrafo e pesquisador da FURG - Fundação Universidade Federal do Rio Grande, Lauro Madureira disse que o reconhecimento dos novos limites pela ONU trará tanto direitos como deveres para o Brasil.
“Teremos mais autonomia para explorar todos os recursos marítimos, inclusive os recursos minerais e o petróleo. As empresas que quiserem explorar essas áreas terão de pedir autorização para o governo. Por outro lado, como signatário da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, seremos ainda mais responsáveis pela manutenção do território marítimo", explica Madureira.
O pesquisador faz parte de um seleto grupo de cientistas que desenvolve, em parceria com o governo, um levantamento da vida marinha na plataforma continental brasileira. O trabalho começou a ser desenvolvido logo após o mapeamento da plataforma, em 1996. O projeto ganhou o nome de Revize, ou seja, Recursos Vivos da Zona Econômica Exclusiva – área a 200 milhas da costa.
“A diversidade da vida marítima ao longo da zona é incrível. Começamos no Amapá, que apresenta condições semelhantes ao Caribe, e acabamos no Rio Grande do Sul, com habitat próximo à Antártica”, revela o cientista. “Boa parte dessas áreas não estão conservadas. Sofreram impacto da ocupação das margens dos rios e da poluição. A pesca predatória afetou a sobrevivência de vários peixes. Entre eles, a sardinha.”